2 de nov. de 2012

4º Encontro Transdisciplinar de História e Comunicação

Paisagens Culturais: Ambientes Midiáticos, História Social e Cidade.
Datas: 28, 29 e 30 de novembro de 2012
Organizado pelo Grupo de Pesquisa Comunicação e Cultura: Barroco e Mestiçagem, do programa de pós-graduação em Comunicação e Semiótica, e o Núcleo de Estudos de História Social da Cidade (NEHSC), do programa de pós-graduação em História, ambos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o evento se propõe a oferecer um espaço de debate a objetos que transitem através de olhares investigativos centrados em temáticas que permeiem as paisagens culturais, ambientes midiáticos e a história social da cidade.
Em 2008, foi dado o pontapé inicial desta parceria. Proposta a temática "Cidade, Barroco e Mestiçagem", pesquisadores de ambos os grupos e áreas afins participaram do evento que marcou concomitantemente o lançamento da Revista Eletrônica de História Social da Cidade – Cordis. No ano seguinte, a problemática urbana e suas implicações agravadas, transformadas ou apenas parcialmente alteradas em sua constituição objetiva e simbólica, tornou-se o eixo de discussão do encontro, sob o título de "Séries Urbanas: conflito e memória".
Em 2011, em sua terceira edição, com a finalidade de permitir a troca de conhecimento e a disseminação do que vinha sendo estudado no campo da Comunicação e da História, decidiu-se concentrar o evento em um eixo comum que permeia tais áreas: "História Cultural e Semiótica da Cultura".
Para o ano de 2012 o Encontro terá como tema“Paisagens culturais: Ambientes Midiáticos, História Social e Cidade”. Paisagem cultural no sentido de não separação entre natureza, espaço urbano e cultura, levando-se em conta que os códigos da cultura elaboram-se não só a partir de sujeitos, mas a partir de objetos híbridos, compostos por articulações entre a dimensão antropológica e as várias dimensões que não dependem especificamente dos sujeitos (fauna, flora, objetos), mas que se desenvolvem a partir de um conhecimento poético da cultura.
As cidades são os lugares onde tais paisagens se ativam, apesar e com à cena tecnocapitalista. Nesta direção, o presente Encontro tem como objetivo reunir em colóquios trabalhos que desdobrem essa região investigativa, no exercício da transdisciplinaridade e no transcurso de múltiplas linguagens que entrecruzam ambientes midiáticos e história social da cidade. Na edição do presente ano, a proposta é que os dois grupos de estudo interajam com outros dos departamentos da história e de semiótica: o centro de oralidade, coordenado pela professora Dra. Jerusa Pires Ferreira e o grupo de pesquisa processos de criação, coordenado pela professora Dra. Cecília Almeida Salles, o Núcleo de Estudos de História: Trabalho, Ideologia e Poder, coordenado pelo Prof. Dr. Antonio Rago Filho, o Núcleo de Estudos da Mulher, coordenado pela Profa. Dra. Maria Izilda Santos de Matos e o Núcleo de Estudos Culturais: Histórias, Memórias e Perspectivas do Presente, coordenado pela Profa. Dra. Maria do Rosário da Cunha Peixoto.
01. CHAMADA DE TRABALHOS
As propostas, contemplando a articulação entre os campos da semiótica da cultura e história social, podem ser enviadas aos Grupos de Trabalho abaixo relacionados, devendo ser direcionadas aos emails dos respectivos coordenadores, inicialmente no formato de resumo. Aos autores dos resumos aprovados será solicitada a entrega do artigo completo para inclusão nas revistas eletrônicas Cordis, do Núcleo de Estudos de História Social da Cidade – NEHSC - e Algazarra, do Grupo de Pesquisa Comunicação e Cultura: Barroco e Mestiçagem, de acordo com o cronograma apresentado a seguir. Serão aceitos textos redigidos em português, inglês ou espanhol.
Os resumos, relacionados à temática do evento e, em especial, aos objetivos e questões de cada Grupo de Trabalho, devem conter no máximo de 400 palavras e até o mínimo de 4 e o máximo de 6 de palavras chaves a serem submetidos até o dia 20 de novembro de 2012.
02. CRONOGRAMA
Até 20/11/12 (Envio de resumos 400 palavras).
O arquivo deve ser salvo em modo de compatibilidade e enviados ao endereço eletrônico historiasemiotica@gmail.com, respeitando a seguinte identificação:número do GT, seguido do sobrenome do(s) autor(es).
Exemplo: (GT 02_MORALES.doc).
  • Dia 23/11/12 - Divulgação do resultado da seleção dos resumos expandidos.
Envio das templates para formatação do artigo.
  • Dias 28,29 e 30/11 – Evento
  • Dia 01/12 - Entrega dos artigos completos para o e-mail historiasemiotica@gmail.com para a publicação na revista eletrônica Algazarra, do Grupo de Pesquisa Comunicação e Cultura: Barroco e Mestiçagem.
IMPORTANTE: a entrega do artigo completo, de acordo com o formato do template (disponível a partir da divulgação do resultado da seleção dos resumos), dentro do prazo estipulado no cronograma, é obrigatória para a inclusão do(s) autor (es) na revista eletrônica. É importante ressaltar que a revisão está – exclusivamente– a cargo do(s) autor (es). O corpo editorial da revista eletrônica guarda-se o direito de, eventualmente, excluir aqueles em desacordo com o resumo ou apresentação.
 
03. FORMATO DO RESUMO:
- Enviado em arquivo Word for Windows (modo de compatibilidade);
- Título do artigo em Caixa Alta e Negrito, fonte Times New Roman, corpo 12 e espaço simples entre linhas;
- Nome do autor, vinculação institucional e formação acadêmica;
- E-mail de contato, endereço completo de correspondência e telefone;
- Texto do resumo em Times New Roman, corpo 12 e espaço 1,5 entre linhas.
Estrutura sugerida: Introdução/ Objetivos e justificativas/ Fundamentação teórica e procedimentos metodológicos/ Principais resultados obtidos e/ou esperados.
04. GRUPOS DE TRABALHO
A submissão dos trabalhos convocados está compreendida na abordagem de três grupos. São eles: GT01 – Paisagens culturais: oralidade, práticas narrativas, história. GT-02 – Paisagens culturais: processos de criação, mestiçagens, cidade e GT03 – Paisagens culturais: tradução, ambientes midiáticos, imaginários. O objetivo desta proposta não é normatizar uma temática, estancá-la na adequação das pesquisas. Pelo contrário, trata-se aqui de considerar o enfoque dos GT’s como fio condutor a fim de direcionar os recortes e a escolha dos processos investigativos para otimizar a exposição das pesquisas. Para tanto, segue as ementas dos Grupos de Trabalho:
GT 01: PAISAGENS CULTURAIS: ORALIDADE, PRÁTICAS NARRATIVAS, HISTÓRIA.
Ementa: Este GT apresenta pesquisas relacionadas à oralidade, práticas narrativas e história; categorias móveis que se articulam para a construção dos relatos trazem a possibilidade de ampliação do saber histórico, das áreas de investigação, a descoberta de novas abordagens e metodologias do conhecimento, como também no que tange à semiótica da cultura. As paisagens culturais se compõem pela articulação entre as variadas linguagens, temporalidades e espacialidades do ambiente. A partir disso, entende-se tal paisagem como lugar de encontro e diálogo de diferentes “formas de contar” que, de modo colaborativo, constituem horizontes provisórios de conhecimento.

GT 02: PAISAGENS CULTURAIS: PROCESSOS DE CRIAÇÃO, MESTIÇAGENS, CIDADE
Ementa: Este GT acolhe produções que mostrem processos de criação, construção cultural e mestiçagem nas diversas linguagens que se relacionam à paisagem cultural da cidade. Obras artísticas, festas populares, escritos literários, grafites anônimos, estéticas arquitetônicas, feiras livres e mesmo o traçados de ruas e calçadas contribuem, com suas especificidades para a tessitura urbana e para a história das cidades, desde seus códigos microestruturais, passando pelo cotidiano até os aspectos políticos, ideológicos e econômicos mais gerais.
GT 03: PAISAGENS CULTURAIS: TRADUÇÃO, AMBIENTES MIDIÁTICOS, IMAGINÁRIOS
Ementa: Este GT reúne trabalhos que abordem o movimento tradutório dos textos e das narrativas na paisagem cultural, desdobrando as conexões entre história, imaginário, representações, por meio de ambientes midiáticos e das traduções em objetos de cultura: suas passagens e transformações nas mídias, nas coletividades, nas práticas, nos ambientes do cotidiano, tendo em conta que a paisagem cultural se dá na trama histórica das coisas e das linguagens, um entremeio de natureza e cultura.
05. APROVAÇÃO E DIVULGAÇÃO DOS PARTICIPANTES
O Comitê Científico, relacionado no item 07 deste projeto, se encarregará de verificar a adequação dos resumos expandidos propostos a participação do 4º. Encontro Transdisciplinar de História e Comunicação. Para tanto, pretende se reunir em um coletivo para não só definir a lista de participantes, mas também encaminhar tal divulgação segundo definição do cronograma.
06. PROGRAMAÇÃO
28/NOV
LOCAL: Aguardando indicação da PUC Eventos
 
Abertura - 9h00 ao 12h00
Prof. Dr. Amálio Pinheiro
Profa. Dra. Cecília Almeida Salles
Profa. Dra. Yvone Dias Avelino
Profa. Dra. Maria Izilda Santos Matos
Prof. Dr. Antônio Rago Filho
Profa.Dra. Maria do Rosário da Cunha Peixoto.
13h30 às 16h30
Mesa redonda “Jornalismo popular: aqui e ali –perspectivas”
Participantes:
Gutemberg Medeiros (USP) – A Violência no Jornalismo
Sílvio Demetrio (UEL) – Jornalismo Popular Norte-americano
Vanessa Ferreira Pessoa (PUC-SP) –Imprensa Popular: procedimentos e estratégias
  • 29/NOV
Local: Aguardando indicação da PUC Eventos
9h00 – 12h00 Encontro do GT – Sessão 01
14h00 – 17h00 Encontro do GT GT – Sessão 02
  • 30/NOV
Local: Aguardando indicação da PUC Eventos
9h00 – 12h00 Encontro do GT – Sessão 03
14h00 – 17h00 Encontro do GT – Sessão 04
07. COMITÊ CIENTÍFICO E EQUIPE TÉCNICA:
Prof. Dr. Amálio Pinheiro, Profa. Dra. Yvone Dias Avelino, Silvia Regina de Jesus, Jurema Mascarenhas Dias, Orlando Garcia, Mila Goudet e Luís Pereira.

11 de ago. de 2012

Cidades, coisas, pessoas

Cidades, coisas, pessoas

Post sugerido por Raquel Rennó
Enviado por efeefe, sab, 08/04/2012 - 00:30

Um número crescente de iniciativas ligadas à cultura livre, à mobilização em rede e à apropriação crítica de tecnologias têm se dedicado a refletir sobre a cidade como construção “hackeável”, e a propor maneiras de interferir nela. É um importante desdobramento que busca superar a oposição artificial entre “virtual” e “real”, e reabilitar a cidade como espaço primordial de disputa na busca de transformação efetiva.
Mais do que lançar ideias soltas na rua, essas intervenções, projetos e articulações se propõem a interferir na própria construção da cidade enquanto infraestrutura coletiva. Dois anos atrás eu me perguntava sobre o paralelo que via entre a maneira como a MetaReciclagem se aproxima das tecnologias de informação e o tipo de mudança que as redes colaborativas podem proporcionar às cidades. Hoje vejo muitas hipóteses sendo colocadas a prova.
Um grupo heterogêneo que circula em torno da Casa de Cultura Digital, em São Paulo, tem atuado em algumas dessas questões. O Baixo Centro vai além de simplesmente retratar digitalmente a cidade, e propõe uma retomada criativa e bem-humorada das ruas. O Arte Fora do Museu dá visibilidade para expressão artística que de outro modo seria invisível, soterrada pela pressa, pelo anonimato e pela rotina da vida urbana. O Ônibus Hacker põe em prática uma ideia sonhada por vários coletivos ao longo dessa última década: um laboratório móvel que se arma onde quer que haja interesse e uma extensão de energia elétrica. Outros grupos e formações, como o Labmóvel, também têm investigado essa relação entre a lógica colaborativa que emerge das redes digitais e o mundo lá fora. Assumindo uma vertente mais crítica, o Laboratório de Cartografias Insurgentes buscou produzir “mapas políticos” que retratassem as remoções e despejos no Rio de Janeiro em decorrência dos megaeventos vindouros. Em comum entre todos esses projetos, a incorporação do espaço público como território compartilhado.
Naturalmente, assuntos como mapeamento colaborativo têm pipocado por todos os cantos (eu mesmo já relatei o Labx, que teve um eixo chamado “geografia experimental”, e algumas brincadeiras com mapeamento aéreo de baixo custo nos céus do Rio de Janeiro). Para quem se interessa especificamente por ferramentas e metodologias de mapeamento, estamos organizando (mais!) uma lista de discussão chamada geolivre. Apareçam por lá.
Do outro lado do Atlântico, o diálogo entre ruas e redes também é foco de atenção. Inspirado pelo Movimento 15M, pela ideia de openness e pelas diversas iniciativas recentes de cartografia cidadã, o Medialab Prado organizou em Madrid a conferência “City Open Interface”. O mesmo Medialab Prado foi também responsável, junto com a Science Gallery, pela realização na Irlanda do Interactivos?’12 Dublin, que reuniu projetos e ideias sobre “hackear a cidade”. O evento se propunha a desenvolver protótipos funcionais para mudar a relação das pessoas com o entorno urbano. É interessante perceber que os projetos selecionados têm uma pegada emergente, de baixo para cima. Ainda mais levando-se em conta que Dublin foi sede do Media Lab Europe, uma espécie de sucursal do Media Lab do MIT. O encerramento do projeto em 2005 é usualmente interpretado como um fracasso na replicação de um modelo que funciona bem nos Estados Unidos, mas que não é necessariamente a resposta adequada para outras localidades (como eu já sugeria aqui). Apesar do nome em comum, a proposta do Medialab Prado - na qual as tecnologias surgem como facilitadores para a construção coletiva das cidades - vai em direção oposta ao modo usual de agir do Media Lab do MIT (que acredita que um software de planejamento urbano pode ajudar a construir as cidades do futuro).
Essa é uma diferença importante que surge entre a perspectiva dos laboratórios experimentais em rede e aquela dos laboratórios de mídia em um formato mais tradicional. Estes de certa forma distanciam-se da pulsação local, transformando-se em lugares alheios a seu entorno para se concentrar em soluções replicáveis a contextos diversos. Enquanto eu entendo essa forma de agir, acredito que ela não deveria ser a única possível. Já propus anteriormente que os labs experimentais podem se tornar interfaces entre a rede e a rua. Pode ser interessante então reconhecer algumas dinâmicas presentes na cidade enquanto construção coletiva, a fim de saber como melhor operar.
Muitos ativistas da tecnologia livre (entre os quais humildemente me incluo) sofremos frequentemente de uma certa síndrome do novo mundo. Identificamos lógicas que funcionam na comunicação digital e logo queremos transpô-las para todas as áreas do conhecimento. É um impulso potente e muitas vezes criativo, mas que pode sofrer de uma superficialidade tremenda. A primeira observação que faço é que a questão urbana, as dinâmicas sociais e a infraestrutura de circulação vêm sendo estudadas há séculos. Suas dinâmicas, inclusive aquelas que se assemelham a pontos críticos da cultura digital - em especial a tensão entre controle e organicidade - já foram analisadas de forma bastante abrangente. Algumas boas ideias (e outras péssimas) foram testadas na prática com populações inteiras. Em vez de jogar na lata de lixo todo esse histórico, podemos buscar pontos de composição com ele - que podem inclusive nos ajudar a entender a própria tecnologia de uma forma diferente.
Bernardo Gutiérrez, jornalista espanhol residente em São Paulo, escreveu recentemente sobre cidades e copyleft, buscando paralelos entre um ensaio urbanístico de Henri Lefebvre e uma compilação de escritos de Richard Stallman. Falando sobre assuntos distintos - respectivamente a cidade e o software -, ambos afirmam uma condição de realidade em construção, de obra inacabada, em relação à qual podemos assumir uma eterna possibilidade de interferência.
É essa transitoriedade que sugere ser possível mexer nas cidades de modo análogo ao software. Mas essa analogia não deve ser interpretada de maneira absoluta. O que interessa aqui é justamente a abertura à modificação, e não uma redução da realidade cotidiana a meros sistemas informacionais. Por mais que a cidade possa ser modificada de forma parecida com o software livre, ela em si não é simplesmente uma descrição digital abstrata. A série de documentários “All Watched Over By Machines of Loving Grace”, produzida por Adam Curtis para a BBC (e disponível para download no Archive.org) mostra a influência que as teorias da cibernética adquiriram ao longo da segunda metade do século XX. Dá exemplos dos efeitos nefastos decorrentes da utilização em larga escala de princípios da cibernética para o dia a dia da administração da economia, da política e da sociedade. Para funcionar, esses princípios supõem a redução de toda ação humana, todo fenômeno natural, toda a realidade à nossa volta, a uma representação matemática. Mas a sociedade não cabe em um modelo matemático. Ela não é o mero circuito de circulação, comércio e “entretenimento” (seja lá o que isso for). Ela é, isso sim, lugar privilegiado da contradição, onde intimidade e anonimato estão lado a lado, onde harmonia e hostilidade podem ser esperadas a todo momento, onde precariedade e oportunidades se chocam.
Merece atenção especial o discurso de “cidades inteligentes” atualmente em construção, alimentado por interesses poderosos inspirados nessa visão simplista da cidade. É assustador perceber a total ignorância que os representantes da indústria têm sobre o tipo de ameaça que essas tecnologias trazem para futuros menos iluminados. Sistemas de controle podem parecer uma boa ideia, mas se caírem em mãos erradas podem ter consequências desastrosas. Mais assustador ainda é ver como são bem relacionadas essas pessoas. Vendem projetos milionários para administrações municipais, que as implementam de cima para baixo, mais uma vez ignorando totalmente a complexidade de implicações que esses projetos têm na sociedade. Não fazem ideia de como realmente se dão os fluxos dentro das cidades (que para Adam Greenfield já são inteligentes em si mesmas, independente de dispositivos interconectados).
Juan Freire lidera o grupo de trabalho “Ciudad e Procomún” do Medialab Prado, que propõe “uma resposta crítica e construtiva ao modelo de cidades inteligentes”. Entre suas preocupações está a disseminação de vários tipos de sensores interconectados e controlados pela administração pública para monitorar em tempo real a vida urbana (a tal “internet das coisas” muito oportunamente questionada pelo IOT Council). Freire afirma que o problema desse tipo de urbanismo não é a tecnologia, mas a reiteração de um modelo de cidade centralizada e hierárquica.
Escrevendo sobre “a cidade da internet das coisas”, André Lemos afirma que pensar sobre tecnologia para cidades não se trata somente de automatizar a comunicação entre objetos informacionais para aumentar a eficiência do dia a dia, mas também de “produzir novos discursos, novas narrativas sobre o urbano (do ser perder, de serendipidade, do ficar invisível aos sistemas de detecção, de ressaltar ruídos e padrões que escapem da utilidade estreita).” A cidade não pode ser administrada como uma partida de SimCity. Infelizmente, isso é justamente o que o impulso pelo controle acaba gerando. Um vídeo da Globo News incorporado no artigo de Lemos retrata a demonstração que o prefeito do Rio faz de seu mais novo videogame, digo, Centro de Operações. Ao longo da reportagem, eu tive a sombria impressão de assistir a uma cena de flashback de algum filme de ficção distópica - aquela cena em que o filme volta no tempo para mostrar quais foram os fatos que acabaram levando a um futuro indesejável. O vídeo está disponível, por enquanto, aqui:

Essa gramática do controle, sobre a qual já escrevi anteriormente, baseia-se justamente na redução da cidade ao modelo cibernético. É justamente esse ponto cego em relação à complexidade da política cotidiana - política aqui entendida como arte da vida coletiva, em sociedade - que escapa às mais bem intencionadas tentativas de diretamente transpor lógicas típicas das redes digitais para o espaço urbano.
No começo desse ano eu acompanhei a certa distância algumas das discussões sobre transparência e controle social da administração pública. Grande parte do que se propõe nesse tema em âmbito municipal trata somente de dados de execução orçamentária - divulgando quanto a prefeitura gastou com cada área de administração. Poucos envolvidos chegam a refletir sobre abrir todo o processo burocrático não somente aos olhos da população, mas também à cabeça ou mesmo aos braços dela. Em outras palavras, o cidadão só pode assistir enquanto a prefeitura gasta o dinheiro - não é chamado a dividir a responsabilidade pelas decisões e em nenhum momento é convidado a ajudar na prática. Mesmo que eu tenha disposição, tempo, conhecimento e ferramentas para ajudar no jardinamento da praça ao lado da minha casa, não sou autorizado a fazê-lo, para não atrapalhar o funcionamento da máquina burocrática para a qual não passo de um número.
Nas redes e nos grupos que discutem essas coisas, costumamos porpor um tipo de relação que se opõe à submissão da sociedade ao funcionamento das novas tecnologias. Acreditamos que, pelo contrário, as tecnologias é que deveriam ser adaptadas para ajudar a construir uma sociedade mais participativa, harmoniosa, aberta à diversidade e justa. Para isso, é preciso ter bem claro que a mera digitalização, interconexão e circulação de informação sobre o espaço urbano não vai criar a cidade que queremos. Na verdade, se essa captura e gerenciamento de informação se presta a fins de controle, enquadramento e exclusão, ela está indo justamente no caminho contrário. Antes uma cidade desconectada do que uma cidade conectada a uma central de controle autoritária!
2012 é ano de eleições municipais. É uma época crucial. Em muitas cidades de todos os portes, os assuntos “cidade digital” e “cidade inteligente” têm ganhado espaço nas campanhas eleitorais. Além disso, o cenário de esvaziamento conceitual nas políticas públicas federais de acesso à tecnologia nos puxa de volta para o local como espaço legítimo de disputa de visões de mundo. Nos últimos dois anos, perdemos muito espaço a partir da imposição de uma lógica mercantilista à visão antropológica que o Ministério da Cultura previamente liderava. Da mesma forma, ganha espaço em Brasília a retórica simplista das “cidades digitais” - que dá importância muito maior à criação de redes wi-fi municipais que oferecem acesso doméstico privado do que a espaços comunitários que proporcionem vivência, troca, experimentação e aprendizado mútuo. Não podemos deixar que essa tendência se torne hegemônica.
Para a grande maioria das pessoas que leem esse artigo, a cidade é uma realidade inescapável. Está logo ali, atravessando a porta. Ela pode parecer opressora, perigosa, impossível de mudar. Mas é só começar a procurar pra descobrir que tem mais um monte de gente tentando. Como fazer pra encontrar essas pessoas? Use as redes!

Este artigo foi escrito com o apoio do Centro Cultural da Espanha em São Paulo.